sábado, agosto 05, 2006

Cuba

Emir Sader escreve na Folha deste sábado, 5 de agosto: “É o regime socialista que permite a Cuba ser o único país no mundo em que não há pessoas abandonadas, sem direitos, sem amparo, sem apoio. Em que não há crianças dormindo nas ruas.”

Pelo que sei, há prostituição em Cuba, bem como há pobreza também. Em quantidade menor do que em países como o Brasil? Talvez sim. Mas Cuba certamente é um país pobre, que até bem pouco tempo vivia a custa de subsídios da União Soviética. Fidel Castro parece nunca ter se preocupado em fazer com que seu país produzisse riquezas.

Nomes como Frei Betto, Fernando Morais e até José Dirceu reverenciam o regime castrista, como se Cuba fosse o paraíso na Terra.

Tendo a desconfiar de textos como o de Sader, embora reconheça que há alguma verdade ali (mesmo que mínima). Sader com certeza esteve em Cuba. E com certeza esteve lá convidado pelo governo, com mordomias que os habitantes locais com toda a certeza não têm acesso.

Quando se quer falar bem de Cuba, alguns elementos são logo abordados: saúde, educação, habitação. Mas no quesito “direitos” há um sério problema. Cuba não é uma democracia. Fidel comanda uma ditadura socialista fechada há 47 anos. Logo, as pessoas não têm direito à liberdade de expressão e escolhas. Geralmente quando isto é dito, muitos fecham a cara, e murmuram algo como: “Bom, mas o povo tem saúde, educação...”

Daniel Piza, que esteve em Cuba, diz: “A velha alegação de que Cuba ao menos distribui saúde e educação para todos não bate com a realidade que vi, e ninguém lúcido acredita nas estatísticas oficiais.”

O problema de boa parte das análises, na minha opinião, é que elas contrapõem modelos completamente diferentes – e modelos que têm falhas, e muitas. Quando analistas dizem que os EUA têm liberdade de expressão, isto é uma verdade, sabemos disso (Michael Moore e Noam Chomsky também sabem).

Já em Cuba essa liberdade não existe – de voto, de imprensa, de escolhas –; portanto, como acreditar, ou melhor, como não duvidar de partidários e do governo cubano? Como não duvidar de um ditador que proíbe obras literárias dentro do país? Como não duvidar de quem proíbe oposição e críticas? Que faz presos políticos? Que taxa como desertor quem quer sair do país?

Acho um pouco de covardia quando alguém diz que o modelo de Fidel não deve ser criticado por ser uma “oposição ao regime capitalista”. Democracia e liberdade de escolha são coisas fundamentais, são a base de uma sociedade, se me permitam o lugar comum. Não me sentiria bem em viver num país como Cuba, e aposto que a maioria dos que a defendem não agüentariam viver por lá mais do que umas férias.

Daniel Piza: “O país é dividido: de um lado, o país dos pesos cubanos, de carteirinhas mensais de remédios e alimentos que não dão nem para uma quinzena; do outro, o país dos dólares americanos, de prostitutas que se oferecem para os turistas a US$ 3 a cada esquina.”

Transição: o que quer o povo cubano?
Algumas coisas chamaram bastante a atenção na tal transferência de poderes. Primeiro: o apego ao poder. Fidel, aos 79 anos, esperou ficar seriamente doente para transferir seus poderes. Segundo: o traço monarquista da coisa. O poder foi passado ao irmão Raúl Castro, de 75 anos. Terceiro ponto: Fidel transferiu todos os seus poderes “provisoriamente”. É algo cômico a carta em que ele delega seus poderes. Começa sempre assim: “Delego em caráter provisório minhas funções como...”. No original, provisório deve ter sido escrito em caixa alta, negrito, itálico e com néon piscando...

Não seria mais fácil lançar um plebiscito, e perguntar diretamente aos cubanos que modelo eles querem, a partir de agora, seguir? Dois terços da população nasceu durante o regime. Mas a pergunta que se faz é: o que os cubanos querem? Enquanto ditadores acharem que o melhor para o “seu” povo é o que ele quer, nunca saberemos.

3 Comments:

Blogger Unknown disse...

Carlos, se o problema for só eleições, você não precisa confiar em fontes de esquerda ou ligadas ao governo cubano. Há outros meios neutros de obter informações seguras sobre o processo eleitoral de Cuba. Em primeiro lugar qualquer estrangeiro (eu, você por ex.) pode ser observador internacional das eleições. Eu fui em 2002. Em Cuba funcionam cerca de 25 mil colégios eleitorais. Não é verdade que o povo não tem o direito de eleger seus representantes. Acontece que Cuba não é presidencialista, mas parlamentarista. Sendo assim, o voto para presidente é indireto, embora reflita o desejo popular. Os candidatos se elegem desde a base. Quem escolhe os candidatos de cada circunscrição (cidade) é a própria população. O cara não precisa ser filiado à um partido, nem mesmo tem de ser comunista para concorrer nas eleições. Se ele for anti-Fidel, pode lançar sua candidatura também (embora sempre vá ter dificuldade de representação por ser minoria). Os eleitos, quer sejam delegados de circunscrições, membros de câmaras municipais e provinciais e deputados da Assembléia Nacional, cumprem suas funções sem cobrar um só centavo! Quando alguém se torna político continua a ganhar o mesmo salário que tinha em sua função anterior. No Parlamento Cubano há representantes de todos os segmentos sociais: militares, religiosos, artistas, intelectuais, camponeses, operários, estudantes etc. A votação é voluntária, livre e secreta. Não existe lei que obrigue os eleitores a votarem. Não há casos de cidadãos exigindo seu direito de votar, como acontece nos Estados Unidos, onde são excluídos milhares de votantes negros e hispânicos por meio de subterfúgios legais. E os deputados da Assembléia Nacional (Parlamento) de Cuba, escolhidos democraticamente pelo povo, elegem o Presidente a cada cinco anos.

06 agosto, 2006 14:41  
Blogger Carlos Eduardo Moura disse...

Bruno, falando assim, até parece que existe uma baita democraria de direito em Cuba. Fidel não aceita tão bem ter inimigos que batam de frente com ele. E quando falo de eleições, não falo de eleições para escolher pessoas, e sim um modelo.

07 agosto, 2006 13:23  
Blogger Unknown disse...

A democracia cubana é imperfeita, assim como a nossa, a da Europa, a dos EUA etc. Agora, quando se fala em democracia, é preciso definir o modelo de democracia em que estamos pensando. Eu penso em democracia em seu sentido original, no sentido original da palavra = poder do povo. Neste sentido, não acho que nossa democracia seja melhor do que a democracia cubana. Se o parâmetro for liberdade de imprensa, não tem como não relativizar as coisas. Lá eles não podem falar mal do socialismo. E aqui a gente não pode falar bem. Cada qual defende o seu. Os dois estão errados, mas liberdade de imprensa será sempre uma utopia. A gente pensa que temos muita liberdade, mas temos coisa nenhuma. Eu não saberia te dizer um país que seja realmente democrático. Sei de países que respeitam com louvor os direitos civis, como a Suíça ou o Canadá. Mas não posso dizer, nunca fui para estes países, apenas leio que as coisas por lá funcionam bem para todo mundo e quase não existe classe social. Democracia, eu acho, tem a ver com isso também. Abraços.

07 agosto, 2006 16:28  

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